PORQUE VOCÊ FOGE TANTO DE VOCÊ MESMO?...

 

    Somente existe liberdade interior e simplicidade de ações se houver amor no coração; e amor como ele é: sem fingimento e praticado em verdade clara e sábia; posto que não baste amar de algum modo..., por vezes amando sem consciência de que amor é uma decisão e uma escolha, sempre em bondade, justiça e verdade/realidade; visto que o amor é sábio e sabe se portar; por isso, não se realiza sem coerência com o tempo e o modo da sabedoria.

    A simples definição acima soa utópica, ou assustadora, caso não seja utópica; e isto em razão de que a maioria vive em níveis tão básicos de raiva e de ressentimento, que, a simples expressão do que seja a liberdade pela via do amor [única liberdade possível], assusta; posto que pareça se distanciar como algo que seja alcançável por nós.

    Ora, que dizer então do “conhece-te a ti mesmo”...? Ou do “sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração”...? Ou ainda da afirmação de “aquele que controla a sua própria língua é perfeito varão”...?

    Interessante é que enquanto fugimos de nós mesmos nos inscrevemos para estudar Deus, para aprender teologia, ou para conhecer a vontade de Deus por revelação mística, ou mesmo para tentar saber o que nos aguarda no futuro; e indo mais distante ainda... acho muito interessante quando dizemos saber o que Deus pensa..., ou por que Ele fez as coisas como elas são...; ou quando reclamamos por não entendermos Quem Ele é ou a razão de Seus caminhos...

    O homem diz que não consegue conhecer a si mesmo e nem escolher o caminho da liberdade pelo amor que se expressa em verdade e fatos de sabedoria — enquanto se candidata a saber Deus, a dizer Deus, a explicar Deus, ou a questionar Deus...

    Sim, para dentro dele, do homem..., nada; mas em relação ao Infinito, o homem quer saber tudo.

    Ou seja:

    O homem foge de sua tarefa interior de auto-conhecimento enquanto se candidata a entender e explicar Deus!

    Na realidade a tarefa do auto-conhecimento só nos é possível em amor e confiança na Graça de Deus, em total descanso em fé; pois, do contrário, o que o homem conhecerá em si mesmo não será exatamente quem ele próprio possa ser, mas apenas o abismo labiríntico no qual o seu interior se tornou..., enquanto ele busca partes de si na escuridão do nada...

    Então, quer dizer que para me conhecer eu tenho que antes conhecer a Graça e o Amor de Deus..., ao mesmo tempo em que você diz que isto não é possível pela própria condição limitada do ser humano? — você indaga.

    Sim! É isto mesmo!

    Para conhecer a mim mesmo eu preciso conhecer a Deus pela via da entrega em fé, e não pela razão espremida pela lógica que aleijou a racionalidade que antes sempre esteve aberta para a Graça e para o milagre do encontro com Deus.

    Daí a humanidade até hoje celebrar como mestres do auto-conhecimento justamente aqueles que viveram no tempo em que razão não era sinônimo de lógica; mas sim de um sentido para além da própria lógica: a verdadeira racionalidade; que é a não limitação do entendimento às lógicas da razão anã; ao contrário, trata-se da integração de todas as variáveis da realidade, as visíveis, as invisíveis, as quantificáveis, as não quantificáveis, as sensoriais e as extra-sensoriais, as pensadas e as intuídas.

    Neste mundo somente conheceu a si mesmo aquele que se entregou a Deus sem nada nas mãos além de nada nas mãos, em entrega...

    Assim, até a viagem do auto-conhecimento não acontece pela lógica, mas pela entrega à serenidade que repousa na aceitação do amor de Deus por todos nós.

    Isto, no entanto, só acontece acontecendo...

    Sim, tem que ser o resultado de uma decisão de loucura de confiança no sentido da vida, em Deus.

    Sem tal insanidade para os padrões lógicos ninguém conhece a Deus.

    Na verdade Deus é Loucura.

    Tudo em Deus é Loucura para a mente do homem...

    Portanto, a verdadeira entrega a Deus é entrega à fé como loucura.

    Ora, é quando isto acontece que se começa a andar nas mãos de Deus, em chão invisível, em caminho não visto pelos olhos...

    É também aí que naturalmente começa a surgir a luz que nos faz conhecer a nós mesmos, tanto mais quanto mergulhemos em Deus como loucura de fé.

    Ou alguém pensaria ou imaginaria que o encontro entre o finito e o infinito seria algo que poderia acontecer fora do ambiente da contradição e da loucura?

    Afinal, afirmar que foi o Amor que criou todas as coisas nos parece ser apenas poesia, mas não fato da existência...

    Entretanto, como eu dizia no início..., como a maioria crê que existe, mas não crê mesmo que Deus exista e seja... — prefere-se estudar Deus, pois as implicações não nos alcançam no nível da implicação pessoal de andar em amor e verdade a fim de que se conheça a si mesmo.

    É nesse limbo que os mais piedosos entre nós ainda vivem...

    Mas a verdade é uma só:

    Sem entrega louca ao amor de Deus ninguém conhece a Deus, e, portanto, ninguém conhece a si mesmo!

    Qualquer outra hipótese não passa de mera falácia e diletantismo sem realidade.

    Pense nisso!

 

    Caio Fabio.